como a relação pessoal de Tite e Felipão estremeceu ano a ano


A inexistência de uma relação para além da profissional entre os técnicos Tite e Felipão é conhecida abertamente nos bastidores do futebol brasileiro. Ex-comandantes da seleção (em duas Copas do Mundo cada), os técnicos de Atlético-MG e Flamengo, que se enfrentam nesta quarta-feira, no Maracanã, em jogo decisivo na disputa pelo título do Brasileirão, têm conquistas e momentos em comum na carreira e já foram muito próximos, mas uma sequência de episódios conflituosos terminaram num afastamento que já dura mais de uma década.

O mais famoso deles aconteceu em um clássico entre Corinthians e Palmeiras, então comandados por Tite e Scolari, respectivamente, pela semifinal do Campeonato Paulista de 2011. Num momento acalorado em campo, Tite se virou e gritou “Fala muito, fala muito” em direção ao rival.

Aquele foi um episódio explosivo, mas a relação já vinha se deteriorando desde o ano anterior, quando o Palmeiras de Felipão perdeu um jogo decisivo do Brasileirão de 2010 na penúltima rodada para o Fluminense, que seria campeão sobre o próprio Corinthians de Tite, principal concorrente do tricolor ao título. Esse é apontado por muitos que acompanharam de perto como o início das faíscas na amizade entre os dois veteranos.

Poucos meses depois, já em 2011, quando o Corinthians foi eliminado pelo Tolima na pré-Libertadores, um dos piores momentos de Tite no clube paulista, novo clássico marcou mais um momento de tensão entre os dois. Com o hoje técnico do Flamengo ameaçado no cargo, Felipão se revoltou e chegou a dizer que poderia até perder o jogo para que o emprego do colega não dependesse disso. O Corinthians venceu (1 a 0, gol de Alessandro), mas o clima pesou e Scolari se explicou:

— Apenas tentei dizer que é um absurdo a derrota de um time proporcionar a saída de um bom técnico. Se não entendeu dessa forma, não vou me preocupar. Agi com transparência e amizade por ele. Se ele tem amizade ou não, deixa para lá.

Naquele mesmo ano de 2011, os dois chegaram a se abraçar antes de novo clássico, desta vez pelo Brasileiro, em dezembro. “É sincero”, disse Tite. “Por mim isso já tinha acabado antes mesmo de começar”, respondeu Felipão, conforme reportagem da época do site ge.globo. Mas aquele parece ter sido um último momento de aproximação.

A história profissional conjunta de Tite e Felipão, hoje com 62 e 75 anos, respectivamente, começou no Caxias-RS, em 1978, quando o atual treinador do Flamengo foi captado para atuar no clube pelo próprio Scolari, que o observou num torneio. Eles já se conheciam de antes como professor e aluno. A origem do apelido de Tite, que se chama Adenor, teria surgido neste momento, numa confusão de Felipão, que na época observava outro jogador jovem com o apelido, Altemir — acabou apelidando sem querer o hoje técnico do Flamengo.

Esse período uma das pautas das poucas vezes em que um se referiu ao outro nos últimos anos. Em entrevista ao programa Bola da Vez, da ESPN, em 2017, Felipão criticou Tite, que afirmou o ter procurado quando assumiu a seleção brasileira.

— Esta palavra (gratidão) não existe mais. Você acha isso correto de quem conhece há 30 anos, de quem te abriu todas as portas? Quem te deu a oportunidade de ser jogador do Caxias, de começar na carreira e arranjar lugares fora do Brasil para trabalhar? Essa é a gratidão? — alfinetou Scolari.

Tite e Felipão comandaram a seleção brasileira em duas Copas cada um — Foto: Alexandre Cassiano e Ivo Gonzalez
Tite e Felipão comandaram a seleção brasileira em duas Copas cada um — Foto: Alexandre Cassiano e Ivo Gonzalez

Tite havia falado sobre a procura em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo: “Tentei conversar com ele e não foi possível. Tentei contato por e-mail duas vezes quando cheguei na seleção e não obtive resposta. Vi que não ia ter diálogo e desisti”. No Bola da Vez, Felipão respondeu:

— Por que tenho que atender se, quando eu solicitei, não fui atendido? Nem ouviu o porquê daquilo. Então está bom.

Dias depois, Tite esfriaria à polêmica:

— Por gratidão, eu não quero mais falar do assunto. Eu e ele sabemos o motivo do problema — disse ao ge.globo durante evento.

Uma visão sobre o desentendimento (nunca confirmada por qualquer um dos dois) foi dada pelo irmão de Tite, Miro Bacchi, em relato à jornalista Camila Mattoso, em biografia do então treinador da seleção lançada em 2016. Uma acusação que remete àquele Palmeiras x Fluminense de 2010, que soltou as primeiras faíscas.

“O Felipe entregou o jogo contra o Fluminense. É uma boa pessoa, mas é um profissional que se transforma. O Felipe é malandragem, é ganhar de qualquer jeito. É um cara de família e eu admiro ele por isso. Mas entra em campo e esquece da vida. Ali acabou a relação”, afirmou Miro.



Source link