Casos de exploração infantil na Ilha de Marajó, denunciados por Damares, voltam ao debate


Denúncias de exploração sexual de crianças e tráfico de pessoas menores de idade na Ilha de Marajó, no Pará voltaram à tona nesta semana, após a repercussão de uma música da cantora Aymeê com o título “Evangelho de fariseus”.

Na letra, a cantora cita os problemas sociais e ambientais na ilha amazônica: “Enquanto isso, no Marajó/ O João desapareceu / Esperando os ceifeiros da grande seara / A Amazônia queima / Uma criança morre / Os animais se vão / Superaquecidos pelo ego dos irmãos”.

A canção repercutiu pelas redes sociais, após a cantora se apresentar na semifinal do programa “Dom reality”, competição musical entre artistas do universo gospel, com transmissão no YouTube, na última quinta-feira (15). Depois da apresentação, Aymeé fez um breve relato das tragédias e crimes que ocorrem em Marajó.

“Marajó é uma ilha a alguns minutos de Belém, minha terra. E lá tem muito tráfico de órgãos. Lá é normal isso. Tem pedofilia em nível hard. As crianças de 5 anos, quando veem um barco vindo de fora com turistas (a jovem se interrompe)… Marajó é muito turístico, e as famílias lá são muito carentes. As criancinhas de 6 e 7 anos saem numa canoa e se prostituem no barco por R$ 5″, afirmou Aymeé.

O anúncio feito pela cantora reacendeu o debate sobre os casos de prostituição e pedofilia que já foram denunciados desde 2006 e até mesmo pela ex-ministra dos Direitos Humanos, senadora Damares Alves (Republicanos-DF). Com a retomada do assunto, artistas e influenciadores lançaram a campanha #justicaporMarajo pelas redes sociais cobrando alguma solução para os crimes. Porém, na época que Damares denunciou os casos ela foi chamada de “louca” e criticada por artistas.

Em setembro do ano passado, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação civil pública contra Damares e a União, para que paguem uma indenização de R$ 5 milhões à população do Arquipelágo do Marajó, no Pará, por supostas acusações de “práticas sexuais violentas e torturas com crianças”. A assessoria da parlamentar disse que “ela nunca foi citada” e na época, reforçou que “a senadora aguarda que o MPF seja implacável na caça aos abusadores e exploradores sexuais de crianças e adolescentes”.

A ação é referente a um vídeo, que circulou na internet em outubro do ano passado, onde a ex-ministra falou sobre os supostos crimes na região – como crianças do Marajó sendo traficadas para o exterior e sendo submetidas a mutilações corporais e a regimes alimentares que facilitam abusos sexuais. O MPF alega que Damares não apresentou provas dos supostos crimes citados. Segundo a pasta, foram registrados, entre os anos de 2016 e 2022, 5.440 denúncias pelo Disque 100 (canal de denúncias do ministério) de exploração sexual de menores no estado do Pará.

Em 2022, a Gazeta do Povo mostrou que os casos de exploração sexual e pedofilia são investigados há décadas na região e foram alvo de inquérito iniciado a pedido da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados, em 2006.

Com o objetivo de investigar e apurar a prática de crimes de pedofilia, também foi criada em 2008, no Senado, a CPI da Pedofilia, cujo os trabalhos foram encerrados em 2010. Em suas recomendações aos estados, o relatório de quase 1.700 páginas sugere medidas de contenção da pedofilia no Pará. Uma delas solicita ao Tribunal de Justiça do estado a criação de comissão interna especial para apreciar com prioridade os processos de exploração sexual de crianças e adolescentes.

De acordo com o relator da CPI, o ex-senador Demóstenes Torres (DEM/GO), o estado do Pará havia apresentado casos “ostensivos” de pedofilia, com o envolvimento de autoridades.

Damares volta a falar sobre as denúncias

Após o assunto vir à tona por meio da música de Aymeé, a senadora Damares Alves parabenizou a cantora e disse que se sentiu “muito tocada” com a mensagem. “Ela é de Belém, ali da região. Ela sabe do que está falando”, escreveu a parlamentar pela rede X, nesta quinta-feira (22).

Damares relembrou que o seu primeiro contato com a “situação do Marajó” foi no inicio dos anos 2000 na Comissão de Direitos Humanos da Câmara. E depois ao acompanhar a CPI sobre o Tráfico de Pessoas, ela disse que conheceu Dom Azcona que “ativista e denunciava os casos que ocorriam na região”.

A senadora também relembrou a CPI de Abuso e Exploração de Crianças e Adolescentes de 2014 que revelou “novas denúncias de abuso e exploração sexual de crianças na região”. “Após isso, inúmeras reportagens denunciaram o que acontecia ali: as crianças que subiam nos barcos para serem abusadas em troca de óleo diesel, em troca de comida ou de míseros trocados. Elas se arriscavam nesse processo e tudo isso acontecia à luz do dia. Por que ninguém fazia nada a respeito?”, escreveu Damares.

“Quando virei ministra de Direitos Humanos coloquei como missão acabar com aquilo tudo. E estive lá dezenas de vezes para ouvir o povo e entender o que acontecia ali. Todo mundo culpava a pobreza e a distância das instituições de Estado. E nossa resposta foi criar um programa, o Abrace o Marajó, para unir governos e a sociedade civil para a melhoria do IDH da região”, complementou.

Segundo a senadora, durante a sua gestão foram realizadas “ações pontuais para socorro da população, com o envio de cestas básicas”. “Tínhamos grandes planos e tornamos nossa ação em um programa instituído por decreto. Mas aí veio a pandemia, e praticamente todos os recursos que havíamos previsto para a região foram transferidos para o combate à doença e suas consequências. Ficou essa sensação de missão não cumprida”, disse.

Damares acusa que os casos aumentaram, após o governo Lula e o Ministério dos Direitos Humanos cancelar o programa Marajó. De acordo com o Ministério de Lula, o antigo programa de Damares foi revogado pela baixa participação social no projeto e pouca efetividade das ações.

“O que o Ministério fez de concreto desde então? Ainda hoje ouço e leio relatos de abusos na região. Isso me parte o coração e espero, sinceramente, que esta música acorde nossa sociedade, acorde o Brasil. Para que quem denuncia os abusos na região não seja silenciado. Para que as instituições dediquem menos tempo com a polarização política e na perseguição a supostos adversários, e estejam mais engajadas em apresentar respostas concretas a este problema”, reforçou a senadora.

“O Marajó pede socorro e não é de hoje. Que dessa vez as pessoas sejam verdadeiramente compelidas a agir ao ouvir o choro silencioso das crianças”, concluiu Damares.





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